O poder dos algorítimos
O mundo está maravilhado com o poder dos algoritmos, mas a vida já tinha descoberto esse poder há bilhões de anos. Tudo o que acontece de interessante é construído por algoritmos, a começar pela própria vida.
Formalmente, a única diferença entre o que Darwin descobriu sobre a construção da vida biológica, e o que os pesquisadores de AIs estão descobrindo com seus algoritmos de “machine learning”, é a escala temporal.
O processo darwiniano opera por seleção natural. É o tempo que seleciona as variantes (mutações) certas por meio de uma longuíssima série de experimentações – tentativa e erro – até que começam a surgir coisas que achamos bacanas, como girassóis e bebês.
O processo das AIs opera por seleção artificial impulsionada por um poder de computação que deixa no chinelo tudo o que está na escala de tempo “natural”. O cérebro – (e nosso orgulho ) – perdem a importância.
Ambas as “seleções” – natural e artificial – são feitas pelo mesmo tipo de algoritmo. O que produz estruturas vivas (como aquela proverbial minhoca que fez tanto sucesso aqui), é a “mesma coisa” que produziu o gato artificial de Andrew Ng; é a “mesma coisa” que traduz qualquer idioma para qualquer outro, que opera tumores, que diagnostica qualquer doença, dirige carros, dialoga com você, compõe música, escreve poesia, testa produtos no mercado, prescreve políticas públicas…
Essa “coisa” opera em compostos orgânicos para criar o DNA do gato natural, e opera em redes de supercomputadores vasculhando data centers para criar cérebros sintéticos muito mais potentes que os humanos.
O atual surto de AI é Darwin que virou nerd.
O algoritmo que Darwin descobriu diz: “Se existe uma grande variedade de copias diferentes de alguma coisa viva, e só algumas delas têm as características certas para sobreviver e gerar crias, só essas ocuparão seus nichos , as outras sumirão com o tempo ”. É assim que a mãe natureza produz as espécies de plantas e animais que existem no planeta- filtrando do ambiente, ao longo da imensidão do tempo, as variantes que têm as características certas para existir em cada nicho.
O que a AI diz é: “se existe alguma ‘inteligência’ capaz de selecionar sinais soterrados em emaranhados de dados , e se há algum mecanismo capaz de reter apenas as seleções ‘certas’, você acaba produzindo uma coisa surpreendente”.
Foi assim que a equipe de Andrew Ng (diz aí se não é Darwin com sobrenome chinês) produziu aquele gato a partir de milhões de vídeos do You Tube, e é assim que qualquer inteligência artificial funciona. Dados, dados, dados… Zilhões de dados escarafunchados por algoritmos, até que produzam algo interessante.
Comece a pensar. Mete medo.
Alguns expoentes em ciência, gente muito conceituada como o físico Stephen Hawking e outros, temem o avanço dos algoritmos de inteligência artificial por causa da imprevisibilidade quanto ao que pode surgir. É que, tecnicamente, a inteligência de algoritmos de AI cada vez mais sofisticados, pode ser hostil aos humanos (pior ainda: pode ser indiferente aos humanos, e, por isso, coloca-los em risco “sem querer”).
Essas AIs “generalistas”- capazes de resolver vários tipos de problemas, como o cérebro faz- estão no radar do futuro moldado pelos algoritmos, e sabemos que trarão ganhos extraordinários. Mas, certamente, embutirão riscos extraordinários também. O maior risco é o de não termos tempo para reagir a uma manifestação hostil que possa adquirir “vida própria”.
Essa inteligência sintética pode realmente (e sem “ficção científica”) embutir um risco existencial para os humanos, como filósofos e cientistas já têm alertado. O cinema tratou disso nos anos 1960. Veja a cena final do filme “2001 – Uma Odisséia no Espaço”.
Continua no próximo post.