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As inovações “cauda longa”

É no novo mundo da cauda longa que despontam autores que não são Paulo Coelho, Gisele Bündchen desconhecidas e bandas que não vão à MTV…

Sabe aquela vontade de dizer “eu não disse?”, quando algo confirma que você estava certo? Em 2000, falando sobre inovações que a Internet induziria no marketing, escrevi que o mercadão de massa iria se fragmentar. Muita coisa fugiria dos lugares em que tradicionalmente é vendida ( market places ) e passaria a habitar os escaninhos digitais, infinitos, do market space. O marketing tradicional padronizou o consumidor: você só pode comprar o que faz “sucesso”, porque é só isso que acha. Sucesso significa: muita gente compra a mesma coisa. Ninguém coloca um “genial” autor desconhecido nas prateleiras de uma livraria, se pode colocar ali um Paulo Coelho. Os superstars garantem o sucesso, mas são uma minoria ínfima. O que mudou? No passado havia, digamos, um “consumidor genérico”, uma espécie de “ Zé Mané geral ”.

Hoje, a revolução digital está desconstruindo o “Zé Mané geral ”. São milhões de Zé Manés , agindo cada um à sua maneira, querendo coisas a seu modo , fazendo opções individuais. O Zé Mané percebeu que pode querer coisas que não são sucesso. O livro A Cauda Longa (Campus, 2006) atualiza essa idéia. O autor conta como ficou abismado ao saber que, dos milhões de ofertas estocadas digitalmente em um serviço como o iTunes (ou o Rhapsody ou o Netflix ou a Amazon, ou a e-Bay), praticamente todas são vendidas pelo menos uma vez por mês. Há sempre alguém que paga por uma faixa de música, pelo filme, pelo livro usado, pelo clique no link do Google, ou pelo sofá velho que o e-Bay divulga. O mercado de massa estilhaçou (eu não disse?). No mercado dos Zé Manés desconstruídos, os muitos que têm algo para vender (a outros Zé Manés) podem fazer sucesso, mesmo que a massa não saiba da existência deles.

Cauda longa é uma referência à forma da curva que descreve isso: um cocuruto alto e estreito onde moram os hits do mercado de massas, e uma longa cauda que mergulha do alto do cocuruto e se estende ao infinito sem nunca tocar o “chão”. Nessa cauda moram os autores que não são Paulo Coelho, os Ronaldinhos Gaúchos dos quais ninguém ouviu falar, as Gisele Bundchen desconhecidas, as bandas que não vão à MTV, os Brad Pitt da periferia global… Todos podem ganhar dinheiro sem serem sucesso de massa. Colocar um Zé Mané que produzisse algo não padronizado, em contato com outro que quisesse aquilo, era impossível na época da economia analógica. Acontecia, mas eram pontos fora da curva. Agora são a curva.O Grateful Dead – uma banda de rock dos anos 60 – foi um ponto fora da curva. Desenvolveu uma relação especialíssima com um nicho de admiradores fora do cocuruto ocupado por Beatles e Rollings Stones (dos quais são contemporâneos). Nunca venderam muitos discos, mas faturam bem até hoje com shows e outras coisas. Se nunca ouviu falar, procure no Google. É um grande caso de marketing. A cauda longa possibilita que uma coisa faça sucesso vendendo pingado, para uma multidão em que cada um compra um pouquinho. Por trás disso há uma possibilidade intrigante. Para ter sucesso, você não precisaria mais tentar vestir um modelito único, tipo “ O Aprendiz ”. Aquele do jovem-focado–dinâmico–que-fala-inglês-se-comunica-bem-é-antenado-com-as-tendências-do-mundo. O mercado de trabalho na cauda longa poderia acomodar todos os modelitos . Para fazer sucesso não seria mais preciso ser “um sucesso”, bastaria apenas ser você. Não seria legal?

* Artigo publicado na Revista Época Negócios – Nº 7 – Setembro2007 – Coluna INOVAÇÃO.

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