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Não pode dar certo. A Física explica por que.

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O post abaixo é adaptação de um que escrevi em agosto de 2013, logo após as grandes manifestações de rua. Não aprendemos nada.

Imagine uma pessoa centralizadora em posição de liderança. Ela gosta de  se envolver no micro detalhe das operações dos seus (39!!!) subordinados diretos. Dizem que eles têm medo dela. O marketing a vendeu como muito boa em gestão. Marketing é uma coisa útil, mas não consegue violar as leis da Física. O sistema está entrando em colapso porque sua (suposta) liderança ignora a mais central dessas leis – a da conservação da energia.

É fácil entender: gestão hierárquica centralizada (comando e controle) dá certo (e só dá certo) quando os problemas a resolver são simples. Problemas simples são os que, uma vez equacionados por alguém “mais acima”, podem ser resolvidos “mais em baixo” por pessoas que não precisam pensar tanto. O topo da hierarquia toma decisões demoradas para que as camadas de baixo possam executá-las rapidamente.

Por exemplo, os CEOs e dirigentes das empresas decidem em que mercados entrar, quais empresas comprar, etc. Decisões que envolvem riscos altos e pedem análises demoradas e cuidadosas. Meses, anos, às vezes. Os gerentes e supervisores abaixo deles, porém, se preocupam com cronogramas num horizonte de semanas. Já os operadores “no chão da fábrica” se preocupam só com o que têm de fazer a cada dia. A telefonista não tem que se preocupar com a estratégia do callcenter, ela foi estabelecida por seus superiores. O soldado não tem de se preocupar se aquela montanha é a que realmente deve ser ocupada, os generais já se preocuparam com isso. Um cérebro pode demorar alguns segundos para compor uma sentença, mas as células nervosas que fazem o serviço (permitem que a sentença seja composta) emitem descargas na escala de milissegundos. Ação mais vagarosa em cima possibilita processos rápidos, eficientes e precisos em baixo.

O que deve nos interessar não é “hierarquia versus não hierarquia”, mas sim “eficiência versus ineficiência”. O  tipo certo de organização (se mais ou menos hierárquica) depende  do tipo de entrega a fazer, ou seja, depende do tipo de coordenação que a organização precisa ter para resolver os problemas que têm de ser resolvidos. É uma coisa econômica, não tem nada a ver com ideias politicamente corretas ou opiniões de gurus.

Uma grande obra de engenharia – a montagem de um Boeing – depende de hierarquias rígidas para ser realizado. O produto final só surge quando se coordenam milhares de sub-ações para que seus efeitos  apareçam no lugar certo na hora certa. Se você é “contra a hierarquia” (porque assistiu a uma palestra daquele guru que diz que “a empresa do futuro é horizontal”) pode tentar montar um Boeing deixando os vários grupos envolvidos trabalharem sem coordenação, mas alguém vai se ferrar (você, ou os passageiros. Espero que seja você…).

Agora, se você trabalha num escritório de advocacia (ou numa empresa de consultoria, ou numa agência de propaganda) pequenos grupos de especialistas atendem, independentemente, às demandas de vários clientes. O que um grupo faz não tem muito a ver com o que outro faz. Então, sua estrutura tem que ser muito menos hierárquica para garantir a entrega prometida com o máximo de qualidade. Neste caso, tem que ser uma rede; tem que haver bastante comunicação “lateral”, não só vertical.

Tudo em gestão é contextual. Não existe uma forma melhor de organizar o trabalho independentemente da entrega a ser feita; tudo depende da entrega.

Quando os problemas são complexos, ou seja, quando há grande multiplicidade de atores, comportamentos e demandas com interdependências não óbvias (como na sociedade brasileira!), controle central rígido não funciona. Nesse caso, a ciência da complexidade ensina que estruturas hierárquicas rígidas desmoronam – entram em colapso.

A solução dos problemas exige mais energia do que uma pessoa apenas pode processar para realizar algo útil. A solução é conhecida: é uma hierarquia distribuída. É distribuir o  processo da gestão para camadas abaixo e coordenar o processo, não controlar. Mas, de novo, se as camadas abaixo são 39 ministérios com suas próprias influências, interesses (conflitantes!) e interdependências, não pode funcionar. Tem que diminuir o número dos ministérios para permitir coordenação (nos EUA existem 15 ministérios).

As leis da ciência da complexidade dizem que para fazer gestão num sistema complexo você tem de usar uma ferramenta de complexidade equivalente à do sistema a ser gerenciado (pesquise “lei da variedade requerida” [law of requisite variety] no Google). Uma pessoa só não consegue esse grau de complexidade por razões físicas! (matemáticas!). A energia para realizar o trabalho TEM que estar distribuída.

Ficar no topo cobrando, cobrando, cobrando não funciona. Não funcionou antes, não está funcionando agora, e não vai funcionar amanhã.

 

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