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Sua empresa na Internet – Parte I

1. Idéias e estratégias para não se enrolar na rede

Até agora, negócios na Internet têm sido uma espécie de briga de rua para conquistar espaço e marcar posição. No Brasil, apesar de toda a barulheira e cacofonia na mídia, não há – além de um nível muito primário – estratégia alguma por trás desse “esforço de ocupação”. Estas siglas de três letras – AOL, BOL, UOL, ZAZ, ZIP – parecem ter sido inspiradas por uma outra: MST – “Vamos invadir e ocupar, depois a gente vê o que fazer”.

Nos EUA, a Amazon.com, a queridinha de 10 entre 10 observadores da nova economia, teve seu modelo questionado vigorosamente e, pela primeira vez, a viabilidade do e-commerce foi posta em dúvida. A estratégia da Amazon enfatiza o crescimento rápido, não o lucro. Não deixa de ser “ocupação de terreno” também. O mercado dá mostras de que cansou de esperar e quer lucros já. O que vai acontecer?

Na hipercompetitiva Internet, escreva aí: a fase de “ocupação a qualquer custo” já está acabando; o verdadeiro jogo começa agora. Grandes apostas estão sendo feitas.

Apesar de sua história tão curta, já é possível tirar lições dos erros e acertos dos pioneiros. A maior lição que está emergindo é: para ter sucesso na Internet, não precisamos aprender técnicas novas, mas sim, adquirir cabeças novas. É muito mais difícil.

A todo o momento, no mundo todo, em empresas de todos os tamanhos e em todos os setores, a mesma pergunta está sendo repetida: “O que vamos fazer com a Internet?”.

A resposta vale ouro.

Se há uma certeza sobre o futuro, é a seguinte: seja qual for seu negócio, a Internet vai mudá-lo. Mesmo que você não venda (nem pretenda vender) pela Internet, mesmo que não tenha site, que não queira saber de banner, link ou endereço eletrônico, seu negócio vai mudar. Simplesmente é isso aí. Ponto. Pontocom, claro.

Dizem que “a Internet muda tudo; que ela introduz regras novas na economia”. Não é bem isso. A Internet não muda o básico de estratégia. A tecnologia muda, mas os fundamentos econômicos não. A Internet exige, isso sim, uma redefinição das ênfases que temos dado aos nossos negócios.

É nisso que teremos de mudar. Não se trata de adquirir novas competências técnicas, mas de começar aceitando que as antigas não vão mais nos levar a lugar algum.

Que atitudes estratégicas fazem realmente sentido na era da Internet?

O mercado de ações americano está dando uma boa “freada de arrumação” no deslumbramento geral. Está mesmo na hora de sermos mais consistentes.

O que é essencial saber para não quebrar? Sim, porque até os paralelepípedos da rua sabem que não vai haver espaço para todo mundo que está aí hoje brigando por espaço. Quem vai ficar?

Em menos de cinco anos, comércio eletrônico e transações virtuais em geral abriram um espaço de experimentação que não tem precedentes no mundo dos negócios, mas não há nada consolidado ainda.

Negócios na Internet ainda não têm nenhum business model definido (fórmula para se ganhar mais do que se gasta), e isso é pré-requisito para alguém poder dizer que tem um negócio. Se eu não sei se o que estou fazendo dá dinheiro, então eu não sei de nada, certo? Mas, então, por que todo mundo está entrando nessa?

Resposta: está todo mundo apostando.

Aposta-se que vai ser possível ganhar dinheiro na Internet apesar de, por enquanto, pouquíssima gente ganhar para valer (a AOL é a única empresa tipicamente pontocom na lista das 500 maiores da Fortune deste ano. Está na posição 337). A única verdade estabelecida acima de qualquer dúvida na Internet é que cada vez entra mais gente nela.

Mesmo os (poucos) que têm lucro ainda estão experimentando. A verdade é: só o potencial da Internet é “sólido”. O melhor negócio na Internet ainda é falar sobre o que será possível fazer na Internet. O foco tem sido não lucros, mas tráfego – aquisição de clientes a um custo altíssimo. Vai haver muito erro, muita tentativa fracassada. É impossível que não haja. O modelo (provavelmente vários modelos) de se fazer negócios na Internet, será estabelecido por seleção natural – os mais aptos é que sobreviverão. Como só se podem saber as características dos mais aptos depois que eles emergem como mais aptos, só há uma perspectiva certa: experimente, experimente, experimente.

2. Construa sua marca

A Internet é uma confusão só. É verdade que lá tem de tudo, mas achar o que você quer ainda é o maior problema. É por isso que navegadores em geral (search engines, browsers e portais) estão entre os maiores campeões até aqui.

O sucesso, em geral, tem sido de ferramentas de navegação para chegar a outros produtos e ofertas, não desses outros produtos em si.

Um portal é o equivalente, na Internet de hoje, ao que foi uma loja de departamentos no início do século, quando o conceito surgiu: entre aqui que você vai achar o que quer, seja o que for. A guerra entre portais é baseada em quê? Botar gente para dentro de qualquer jeito. Criar hábito de uso para garantir que, quando a coisa for para valer, eu terei a chave da porta da entrada de clientes em qualquer outro site. Aposta-se que parte dessa gente toda que hoje entra na Internet sem parar, fará compras de supermercado on-line. Aposta-se que parte dela comprará pacotes turísticos, livros, brinquedos, aposta-se que parte dela…

Enfim, apostamos que essa “parte dela” seja gente suficiente para gerar uma receita importante num primeiro momento, e lucros consistentes no futuro. Se você se acostuma ao ambiente de um certo portal, a tendência é ficar nele, e fazer tudo através dele. Esse pessoal de três letras que eu citei sabe disso. Para esses, conquistar terreno hoje é a opção. Mas é uma aposta para gente grande.Tem de ter muito $$.

Nenhum player tradicional (varejista estabelecido) pode dar-se ao luxo de deslocar seu foco rápido demais para o mesmo negócio on-line.Tem de manter um pé (um pezão, eu diria) no negócio convencional, ao mesmo tempo em que coloca um pezinho on-line. Talvez seja possível inverter isso no futuro, ou mesmo saltar com os dois pés para o negócio on-line em algum momento. Talvez. Mas essa história de “entre com tudo agora ou você estará morto amanhã”, simplesmente não faz sentido. Não caia nessa. Vamos voltar a isso adiante.

Pela primeira vez, um meio de comunicação consegue combinar riqueza e alcance da informação para uma variedade enorme de ofertas econômicas. Quer dizer: você consegue comunicar os detalhes de seu produto ou serviço (riqueza) para gente no mundo inteiro (alcance), a um custo desprezível. Nenhuma mídia anterior foi capaz disso, portanto é compreensível o frenesi em relação ao comércio eletrônico.

Mas, e quando o modelo unânime de competência em e-commerce até aqui é questionado agressivamente, como aconteceu agora em junho?

3. Por que eu aposto na Amazon.com?

Se há uma empresa padrão da nova economia é a Amazon. Um case. Começou vendendo livros, depois CDs, fitas de vídeo, brinquedos, remédios, faz leilões, vende produtos eletrônicos, material de jardinagem, utilidades domésticas. Nunca teve um tostão de lucro. De 1997 para cá, faturou 2,9 bi de US$, mas teve de levantar 2,8 bi no mercado, para dar conta de suas necessidades de caixa. Para poder garantir a entrega da multiplicidade de produtos que vende, teve de investir, cada vez mais, em infra-estrutura física: contratou gente, construiu depósitos pelos Estados Unidos afora e está tendo de aprender a gerenciar estoques na marra.

Vive com o dinheiro do mercado de ações – que sempre acreditou na sua ousadia – e também de empréstimos a juros baixos.

(Exatamente porque as ações vinham se mantendo muito valorizadas, a empresa se apoiava num tipo de empréstimo em que as taxas eram metade das do mercado, por serem, de certa forma, lastreadas pelas ações.)

Note a ironia: para poder cumprir sua pomessa virtual, a Amazon teve de construir galpões e estocar produtos, coisas nada virtuais em que não tinha qualquer experiência, e que já fez muito varejista experiente quebrar: se você se estoca demais, o custo de manter o estoque pode ser maior do que o que você ganha na operação, pois as margens são muito baixas. Aprender a estocar na medida “certa” para dar conta da demanda é a alma do negócio no varejo. A Amazon não sabia nada dessa “competência essencial” do velho varejão.

Em 22 de junho passado, um analista da Lehman Brothers – uma autoridade em finanças corporativas – fez prognósticos sombrios para a Amazon, que apresentava fluxo de caixa negativo (estoques mal gerenciados) e muitas dívidas. Aparentemente ela se estocou em excesso para dar conta da demanda no período do Natal passado. No primeiro trimestre de 2000, o vermelho saltou de 31 milhões para 320 milhões de US$.

Suas ações, que já vinham perdendo fôlego desde o início do ano, despencaram 20% após o relatório da Lehman. Colocou-se em dúvida até mesmo a viabilidade do comércio eletrônico em geral. Todo mundo pensou: “sem competência nas artes do varejo tradicional (armazéns, estoque, logística) esse negócio de e-commerce pode revelar-se uma balela. Se a grande Amazon, o exemplo supremo de competência na Internet, se der mal, quem se dará bem?”.

Eu aposto na Amazon: os custos dos galpões já estão incorridos (não vai ser necessário ficar construindo cada vez mais, e contratando cada vez mais gente para gerar vendas); pode vir a se revelar viável até terceirizá-los mais tarde para uma empresa de logística – UPS ou Federal Express, por exemplo. A rapidez com que a empresa se moveu até aqui foi estonteante, e eles parecem muito inteligentes para não terem aprendido a lição (em quatro meses, tornaram-se líder em venda de CDs e, em brinquedos, já atingiram a marca de 95 milhões de US$) .

Aposto que vão se dar melhor com o estoque para o Natal deste ano. As vendas por cliente vêm aumentando (passaram de US$ 107 em março do ano passado para US$ 121 hoje), e essa é a chave da estratégia da empresa: vender cada vez mais coisas para uma base de clientes fiéis à marca Amazon. Hoje, ela tem 20 milhões de clientes. Há um ano, tinha metade. Os custos da entrega estão caindo (ela está aprendendo) e o resultado operacional ($$) ficando cada vez menos negativo.

A Amazon tem uma estratégia que, para mim, faz sentido. Eu aposto na capacidade de a empresa aprender. E você?

Atenção, senhores professores de cursos de administração pelo Brasil afora: o caso da Amazon é o mais rico em ensinamentos que conheço hoje. Mistura a atualidade do tema comércio eletrônico, com a mentalidade super-empreendedora do CEO, Jeff Bezos (a “personalidade do ano” em 1999, para a Time Magazine), mais a aposta num business model novo para varejo e, o mais importante de tudo, a história ainda não tem desfecho. Ninguém sabe no que vai dar.

Al Ries, o famoso autor de “Postioning”, aposta noutra direção. Na Business Week de 10 de Julho de 2000, diz: “As marcas mais poderosas do mundo se referem a coisas simples – Volvo é segurança, Dell é computador pessoal, mesmo a Microsoft é software. Mas a Amazon quer representar livros e churrasqueiras ao mesmo tempo. Isso não faz sentido para mim”. Bezos responde, repetindo o que vem dizendo há tempos: ” Amazon quer dizer serviço de alta qualidade na Internet. Clientes que estejam procurando isso vão voltar sempre.”

O debate é bom. A coisa deve estar bem mais clara daqui a um ano. Que tal discutir esse caso hoje e, ano que vem, ver o que a vida real nos traz? Há duas referências recentes, muito boas, que capturam bem a coisa (Business Week de 10 de julho e Economist de 7 de Julho). A Amazon está investindo num modelo de varejo que mistura o mundo físico com o virtual. Tem colossais problemas de logística a resolver e competências novas a adquirir. Sua aposta é muito ousada. Ela não é Marlboro nem Coca-Cola, mas pode tornar-se uma típica marca da Internet e valer tanto (ou mais,quem sabe?) que essas outras.

4. A Internet é apenas mais uma mídia como outra qualquer?

5. Que saudade da velha economia!

A Internet vai mesmo é gerar receita de propaganda para as velhas agências e velhas mídias de sempre.

A ironia é que as novas empresas da Internet dependem desesperadamente dos velhos meios de comunicação. A nova economia tem sido uma dádiva dos céus para boa parte daquelas “velhíssimas” agências de propaganda da economia-naftalina que, segundo os especialistas, não teriam mais lugar nesse admirável mundo novo das transações virtuais. Para elas, com tantas empresas pontocom precisando se fazer notar a qualquer custo, a febre virtual tem sido uma verdadeira corrida do ouro.

Três anos atrás, apenas uma empresa on-line comprou espaço de propaganda na transmissão da final do Superbowl pela TV americana – o intervalo comercial mais caro do mundo. Neste ano, 17 compraram. Quase metade de todos os 37 comerciais exibidos foi de empresas pontocom. Uma inserção (eu disse uma inserção!) de 30 segundos ali, pode chegar perto de 3 milhões de US$, e há empresas investindo três, quatro vezes sua receita total nesses 30 segundos. Loucura americana. Vai passar, mas enquanto não passa, a mentalidade parece ser: “deixa eu pegar uma graninha desses investidores deslumbrados e jogar minha vida nesses trinta segundos”.

Nos EUA, como aqui, a mídia convencional nos inunda. Por trás de tanta “comunicação”, os mesmos publicitários de sempre (“vejam como eu sou criativo!”) lutando pelos seus prêmios e badalações na mídia (“vejam como eu sou maravilhoso!”),com aquele jeitão falsamente cool e desinteressado (“genial? eu? bondade sua…”).

Os resultados para o cliente? Bem, o cliente paga a conta direitinho, né? Boa parte deles não estará mais por aí daqui a algum tempo – falo dos clientes, claro. Os publicitários certamente estarão; são eternos.

Fala-se numa nova geração de jovens empreendedores, milionários aos vinte anos. As tais empresas pontocom são, unanimemente, o objeto do desejo das novas gerações de profissionais, e até servem para oxigenar mercados e profissões já não tão novos (jornalistas, por exemplo, atualmente contratados com o apelido de produtores de conteúdo).

A onda do comércio eletrônico parece mesmo irresistível, mas eu, cada vez mais longe de estar milionário, já não tão jovem e bem menos empreendedor do que gostaria, me pego muito desconfiado com esse deslumbramento todo.

Está faltando algo. Falta estratégia. Sem estratégia, boa parte (a maior parte, eu arriscaria) desses experimentos vai sumir rapidinho. A operação (publicitária) por enquanto, tem tido sucesso, mas será que o doente sobrevive?

A HotJobs.com é uma agência de empregos americana on-line. Seu mais recente comercial de TV é assim: abre com um homem varrendo a jaula de zoológico, de costas para um gigantesco traseiro de elefante. Vê-se o paquiderme sentar-se e, rapidamente, levantar-se de novo… cadê o varredor? Sobrou só a vassoura. A insinuação é inequívoca: foi sugado pelo traseiro gigantesco. O locutor pergunta: “Você ainda está entalado naquele mesmo velho emprego?”

A Fox recusou-se a veicular: “Não achamos graça numa pessoa inserida no ânus de um elefante” explicaram.

Veja outro: no início do período letivo nas universidades americanas (em pleno inverno) há uma corrida para comprar livros. Estudantes duros ficam horas na fila para obter seus descontos nas livrarias. O site ecampus.com promete resolver o problema.

O filme abre com uma fila de pessoas na neve. Parecem estar no Ártico.Todos com caras cansadíssimas, barbas congeladas, bigodes cheios de neve, roupas pesadonas. Parecem flagelados. Um deles se vira para os demais: “Pessoal, estamos sem comida e sem água, quanto tempo mais vamos agüentar? Nosso amigo Kowalski, ali atrás, está inconsciente há dias. Proponho que a gente o mate e coma de uma vez”.

Então a câmera abre, revelando que aqueles tipos estão é na fila de uma livraria.

O locutor diz: “As filas nas livrarias são lentas. Por isso, criamos a e-campus.” Corta de novo para a fila na neve e o filme acaba com um deles olhando para o pobre Kowalski e dizendo:

“OK, vamos então começar pelas nádegas…”

Pela amostra, os americanos parecem adotar variantes diferentes para a nossa fixação verde-amarela em bumbuns de humanos (quer dizer, de humanas). Imagino como seria o comercial do elefante por aqui: ele estaria rebolando sensualmente (ao som do “tchan” na certa, ou talvez, “na boquinha da garrafa” – um desses primores de conteúdo coreográfico). Depois, famoso com o sucesso, o bichão abandonaria a carreira de modelo de filmes publicitários para lançar um programa solo, infantil naturalmente, e provar que “posso vencer pelo meu talento. Não quero ser apenas mais outra bunda paquidérmica como tantas por aí…”

Desculpe a digressão, leitor. Voltemos ao que interessa…

6. A maior parte das atividades comerciais vai mesmo ser eliminada pela Internet nos próximos dez anos?

Não acredite nisso.

Minha aposta: a Internet é sim um salto muito mais radical do que transições anteriores em meios de comunicação; vai sim afetar profundamente todos os tipos de negócio, mas só um número relativamente pequeno de atividades será, de fato, eliminado por ela. E ninguém pode saber quando isso vai acontecer.

Dizem que estamos vivendo vários “fins” – o fim da velha economia; o fim da distância, da geografia; o fim das fronteiras; o fim da empresa; o fim do emprego; o fim da universidade… O furor virtual derruba (desconstrói) tudo, dizem. Esse “finzismo” – ótimo para dar títulos chamativos a livros e artigos – é uma idéia pela qual é muito fácil se deixar levar, mas cuidado.

Consultores, gurus e “especialistas” em geral ganham a vida nos assustando com previsões catastróficas para o futuro próximo. Como ninguém nunca está preparado, e como 100% das pessoas são inseguras, essas “autoridades” faturam, faturam e faturam. O mercado para o medo e a insegurança é o maior do mundo.

(Eu disse que 100% das pessoas são inseguras? Pois na categoria “executivos de empresa”, o percentual é 200%).

Previsões bombásticas não são novidade, mas têm uma característica interessante: quase sempre estão erradas. A esmagadora maioria delas nunca acontece. O que muda hoje é que não se está falando de eventos distantes, mas em coisas que vão nos alcançar ainda vivos, mudanças radicais – na empresa, na vida – para daqui a três, quatro, dez anos.

Bolas, por que não param de nos aborrecer, e reconhecem logo que ninguém sabe como o futuro será? Não, claro que não. Vamos faturar em cima de quê?

A conhecida “faturista”, perdão, futurista, Faith Popcorn, disse: “Em 2010, 90% de todos os produtos serão entregues em casa. Vão colocar um refrigerador em sua garagem, e códigos de barras em sua cozinha. Toda semana, eles vão re-estocar seus artigos preferidos, sem que você tenha sequer de pedir…”

Na década de vinte, previu-se que em 50 anos todos teriam seu avião particular, e que passaríamos férias na Lua. Cadê seu avião, leitor? O meu? Bem, hoje eu vim de ônibus, queria fazer um pouco de exercício, sabe?

“Vem aí o escritório sem papel” – afirmou a Business Week numa reportagem – já famosa – em 1975. A venda de papel para escritório só faz aumentar, e hoje é o dobro da que era em 1975. Você já viu algum escritório paperless, leitor? Eu nunca vi. O simples bom senso nos aconselha a tratar afirmações assim com um pé bem atrás.

Existir tecnologia disponível para nos fazer desempenhar “melhor” velhas tarefas não quer dizer que as pessoas vão desenraizar-se imediatamente de seus velhos hábitos.

Cultura conta. Conta muito. O problema é esse “melhor”. Quem define o que é “melhor”?

Quando surgiram os videocassetes (VCRs), Hollywood não gostou. Os grandes estúdios pensaram: “as pessoas vão achar melhor assistir ao filme em casa. A indústria do cinema vai quebrar. Vamos proibir que se gravem os filmes diretamente da TV”. Fizeram de tudo para controlar as locadoras através de uma série de arranjos de licenciamento. Não conseguiram. As locadoras massificaram o vídeo para o povão, e os preços das fitas e aparelhos VCR despencaram.

Hoje, a demanda por fitas de filmes para compra (não para locação), não pára de aumentar, enquanto a indústria de aluguel de fitas está estagnada. Os estúdios vão muito bem, obrigado. A indústria de vídeo aumentou o valor da indústria do cinema. Quanto mais gente tinha VCRs, maior a demanda por fitas, maior a demanda por VCRs, maior a demanda por novos filmes, etc… Hollywood desistiu rapidinho de hostilizar as locadoras. O VCR salvou Hollywood, isso sim.

O Citibank, ao introduzir os caixas automáticos, queria agregar valor para uma fração de seus clientes – aqueles com mais dinheiro no banco. Esses seriam atendidos face a face nas agências. O pressuposto era: “os ricos vão achar melhor receber atendimento personalizado nas agências. Caixa eletrônico na rua seria só para o povão”. O que aconteceu? Todo mundo quis caixa eletrônico, os ricos inclusive. Uma inovação tecnológica introduzida para aumentar a percepção de valor dos clientes vip com relação ao banco, passou a ameaçar os bancos, pois os vips não valorizavam tanto o tal contato personalizado na agência, quanto valorizavam o caixa eletrônico na rua. Foi o contrário do efeito esperado. A marca do banco, um patrimônio extraordinário – estava a ponto de perder o valor: “não importa o banco, eu quero é um caixa eletrônico por perto” – essa era a tendência geral.

Quem define o que é melhor é o cliente, e só ele. Ele, com sua cabeça “irracional” e cheia de manias. Você tem de entender a natureza humana para fazer marketing, na Internet ou fora dela.

Tecnologias que envolvem o que se chama de efeitos de rede (network effects), têm uma característica interessante: tem de haver uma massa crítica de gente usando, para que o produto decole realmente, e isso leva tempo. Com a Microsoft foi assim – anos e anos acumulando usuários lentamente e, “de repente”, a explosão. Todo mundo usa Windows porque…”ora, todo mundo usa Windows!”. O produto praticamente se vende sozinho.

A tecnologia do fax foi patenteada há mais de 100 anos. Na década de 20 a At&T lançou um serviço nacional de transmissão de fotos via fax, mas o aparelho de fax só decolou mesmo na década de 80, num período de 5 anos – entre 1982 e 1987. Num curtíssimo período, todas as empresas já tinham, pelo menos, um aparelho.

A primeira mensagem de e-mail foi enviada em 1969 mas, até meados de 80 só nerds do mundo acadêmico usavam correio eletrônico. A tecnologia da Internet foi desenvolvida no início dos anos 70, mas só decolou no final de 80. Só quando a coisa atinge massa crítica é que explode.

Moral da história: ninguém – nenhum especialista, nenhum guru – pode prever a dinâmica da adoção de novidades tecnológicas que alterem hábitos arraigados. Pode acontecer rápido. Pode acontecer devagar. Você tem de apostar.

O melhor termo para isso é aposta mesmo. Só fica óbvio depois de acontecido e analisado. Você sabe aonde eu quero chegar. Eu quero chegar à Internet.

Continua >> Sua empresa na Internet – Parte II

Não. É diferente. Diferente como TV é diferente de rádio, que é diferente de jornal. Cada mídia dessas alterou, mas não eliminou, as que haviam antes.

Boa parte das empresas on-line que hoje fazem barulho nos meios de comunicação apóiam-se num modelo que pode ser resumido assim: “atraia gente para seu site de qualquer maneira e fature vendendo espaço de propaganda “. Ou, o que dá no mesmo: “dê seu conteúdo de graça ou venda-o mesmo com prejuízo, aumente o tráfego, e venda espaço de propaganda”.

Esse é o modelo da televisão tradicional. Minha aposta é que não funcionará na Internet.

Propaganda na Internet não vai servir de fonte de receita apreciável para ninguém. Eu sei, eu sei, você vai me lembrar que o Yahoo fatura adoidado com banners de propaganda. Eu respondo: não é sustentável porque… ora, porque Internet não é TV. É um meio interativo, e é fútil anunciar em um meio em que a atitude das pessoas, basicamente, é condicionada pelo diálogo, não pelo monólogo a la TV. Nada a ver com ficar sentado assistindo passivamente a algo – ar bovino, cigarro numa mão, copo de cerveja na outra, barrigão crescendo… eu hein!!

Há quase três anos, eu contei em Exame o melhor caso que conheço para demonstrar que Internet não é TV:

A Volvo americana foi a primeira fabricante de carros a estabelecer presença na Web no fim de 94. Produtora de carros de luxo, queria estabelecer um canal de vendas adicional. Seu raciocínio: só 6% da população adulta dos EUA teria dinheiro e inclinação para comprar um carro de US$ 30.000. O chamado perfil psicográfico dessa gente se encaixava perfeitamente com o dos primeiros surfistas da Web: experimentadores de novidades, ligados em tecnologia, educados e com algum dinheiro. A Volvo gastou US$ 100.000 desenvolvendo uma espécie de folheto de vendas eletrônico para a Web. Tudo perfeito, segundo a lógica de marketing que conhecemos. O resultado? Vendas zero. E mais: quem entrou no site usou o mecanismo de interação que estava disponível nele, o e-mail, não para encomendar Volvos novos, mas para reclamar de pequenos defeitos dos Volvos que já possuíam. A legislação de vários estados americanos exige que essas reclamações sejam respondidas num certo tempo, senão, o fabricante fica obrigado a devolver o dinheiro do comprador. Como a Volvo não tinha ninguém para responder às mensagens por e-mail, seu site estava funcionando como uma forma, não de aumentar vendas, mas de… diminuir vendas já fechadas!

Propaganda é a opinião do fabricante do produto, mas o consumidor na Internet quer dar a sua opinião, quer exercitar sua individualidade, sua atitude. Quer ser levado em conta. Em agosto de 1999 eu escrevi:

Uma empresa on-line chamada Reel.com começou a vender cópias do megahit Titanic por $9.99 assim que o filme chegou aos cinemas. A Paramount – o estúdio que produziu o filme – fornecia-lhe as fitas a 15$.

A Reel.com gastou milhões de dólares anunciando sua promoção. O que ela queria? Atrair toneladas de visitantes e chegar ao lucro vendendo espaço de “propaganda” (banners) em seu site. Milhares e milhares de pessoas foram ao site comprar o vídeo. A Reel.com estava gastando 600 mil US$ por semana anunciando a promoção, mas lucros nada. Estava quase perdendo os 7.7 milhões de dólares que os investidores tinham colocado no negócio, e ia quebrar, quando foi comprada por $ 100 milhões por um gigante do ramo de aluguel de fitas de vídeo chamada Hollywood Entertainment. Ufa!!

Esses booms não podem durar. O que vai acontecer? O mais provável é que os investidores, de repente, resolvam cair fora, percebendo, finalmente, que esses business models realmente não funcionam, ou redescobrindo que o que dá valor às empresas é lucro. Não hits, não apenas receita, não atenção da mídia, não perspectivas, não jovens corajosos. Lucro.

Agora a Reel.com volta a ser notícia. Leio na Time de 3 de julho:

“Semana passada a sede da Reel.com em Emeryville, Califórnia, parecia uma cidade fantasma… a dona da empresa, a Hollywood Entertainment, procurava um jeito de dar-lhe um enterro decente…”

Eu avisei.

Temos browsers de graça, e-mails de graça, computadores de graça, acesso de graça, PCs de graça… Chega? Tem mais: há gente pagando aos usuários para se expor à propaganda enquanto navega pela rede. A Alladvantage.com paga 50 cents a hora (até dez horas por mês) para isso. Há todos os tipos de coisa de graça: brindes, pontuação (a la sistema de milhagem) dando direito a prêmios ou dinheiro; enfim, pense no que quiser.

Repito: não vai funcionar.

O site Buy.com (“os menores preços da Terra”) promete vender por menos que qualquer competidor, mesmo que isso signifique vender com prejuízo. Eles têm tecnologia que os habilita a percorrer os sites de competidores e ajustar seu preço para ser sempre o menor. Talvez se torne a empresa americana que mais vendeu no seu primeiro ano de vida (o record da Compaq ,US$ 111 milhões, pode cair). Lucro da Buy.com? Zero.

Tenho minhas dúvidas até mesmo quanto à fórmula mais elegante: dou algo grátis em troca de informação sobre hábitos de compra, gostos etc… Isso permitiria direcionar as ofertas para o que interessa mesmo a cada cliente individual. Vale experimentar, mas eu quero ver primeiro resultados que indiquem a eficácia disso. Desconfio que o que é relevante possa simplesmente não estar sendo informado direito. Para obter o que quero, digo meu nome e e-mail corretamente, mas informo o resto errado, ou omito.

Hobby: ópera, grupos de pagode e axé music (arghh!!).

Esporte preferido: pesca à baleia.

Renda anual: esquece, é menos do que eu mereço.

Um pouco melhor, é a propaganda direcionada por interesse: se eu entro num portal ou search engine para procurar, digamos, “material de pesca”, é razoável supor que, se aparecer um banner de alguém vendendo anzóis, eu tenha boa chance de clicar nele. É isso que sites como Yahoo fazem, vendendo seu espaço direcionado assim, pelo dobro do preço dos banners normais.

Ei leitor, não seja ingênuo, Yahoo já existe. Nem o Yahoo sabia que ia se tornar Yahoo.

Pode anotar:
Para vencer na Internet, você tem de inventar um conceito diferente dos que já estão aí, e ser o primeiro nele. Ao contrário do que ocorre lá fora, na Internet, muito provavelmente, o segundo não vai ser nada.

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