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Senha: Cliente – Parte I

1. Que diabo é economia da informação?

“A grande vitória do nosso tempo, é a vitória da imaginação sobre a crença estabelecida. Nossa cultura abraçou a mentalidade Star Trek, quer dizer, se você é capaz de imaginar algo, e se o que você imagina tem base tecnológica, provavelmente vai acontecer.” Jay Walker, fundador da Priceline.com.

O que terá feito o “produto per capita” na Europa Ocidental, após séculos de semi-estagnação, ter aumentado cerca de 4 vezes de 1850 a 1960, e daí em diante ter decolado quase verticalmente até hoje? As causas históricas que o artigo examina (recomendo enfaticamente) são interessantes, mas são assim, digamos, meio “Economist” demais, percebe? Eu arriscaria uma interpretação que o artigo não menciona:

Guardadas as proporções de escala, a explosão de riqueza coincide com a explosão da informação codificada da curva de Merrifield. Progresso econômico tem a ver com inovação, e esta, com comunicação. Quanto mais abundante, livre, e precisa for a comunicação, mais progresso, mais riqueza. O início do salto foi a revolução industrial e a eletricidade, mas a explosão coincide com a liberação da informação proporcionada pelo código digital.

A era da informação está sendo construída principalmente pela abstração de coisas reais em símbolos, e pela codificação da realidade através da linguagem digital. Ao fazer isso, essa linguagem altera a realidade que se propunha a representar, e nos expõe a novas dimensões do que significa ser humano.

Nossas cabeças são ainda analógicas. Nós adoramos a verborragia desenfreada (do advogado, do deputado, do publicitário, do pastor na igreja). Tudo analógico. Tudo velho. Enquanto não tínhamos opção tudo bem, só que hoje temos.

Pode apostar: o digital está só começando a mostrar seus efeitos. Haverá avanços muito mais espetaculares, que ainda não conseguimos prever, mas que virão com certeza absoluta. Estamos mesmo decolando rumo a algo, o que será?

4. Antes de tratarmos da Internet…

1- Toda mensagem tem redundâncias – coisas que, em princípio, não precisariam estar lá, mas sem as quais a mente humana não conseguiria decodificá-la. A mensagem chegaria confusa, ou se deterioraria no caminho até o receptor, perdendo a integridade.

Não pense que seria melhor não haver redundância. Não é isso. Redundância é fundamental para se garantir que a mensagem vá ser decodificada. A questão-chave é quanto de redundância e quanto de informação colocar na mensagem. Esse é o desafio do marketeiro ao montar suas ofertas para o mercado.

2- Se descobríssemos um código de comunicação – uma linguagem – que nos permitisse enfatizar realmente a informação, tornando-a fácil de decodificar, e eliminando ao máximo redundâncias e ruído, teríamos um enorme ganho. A mensagem seria mais precisa e mais econômica.

A economia só funciona do jeito que funciona, por falta de alternativas práticas. Pense um pouco: vendedores, propaganda na TV, promoções, shopping centers, supermercados, revendedores… Estamos tão acostumados com essas coisas que achamos que elas são parte natural da paisagem, que a economia só pode funcionar através delas. Errado. Errado. Errado. Elas são o melhor arranjo que conseguimos para comunicar nossas ofertas econômicas com a linguagem disponível. Se aparecesse um código “melhor”, a economia mudaria.

3 – E não é que apareceu?
O código digital, o mais econômico dos códigos. Aquele que permite transmitir mais informação, mais precisamente, quase sem ruído, com um mínimo de redundância, e de forma mais barata.

É por isso, leitor, só por isso, que a economia está de pernas para o ar. É inexorável. O digital vai reconfigurar tudo. É impossível exagerar seus efeitos. Já está acontecendo. Note que não estou dizendo que o supermercado ou o shopping-center vão acabar.
Estou dizendo que eles vão mudar profundamente.

Ao desafiar a maneira estabelecida de se comunicarem ofertas econômicas, a linguagem digital nivela todo mundo e cria um universo de possibilidades novas. Vai vencer quem ousar mais. Espírito empreendedor é o atributo mais importante para qualquer gerente hoje. Não há regras estabelecidas. Esqueça seu curso em Harvard. Estudar modelos do passado não adianta muito. Corra para Silicon Valley. Junte-se a um empreendimento imaginativo. Quebre a cara. Sucesso!

4- A mente humana só confere valor ao que sai da mesmice e a surpreende de alguma maneira. Surpresa, nesse sentido de descoberta, é da essência da informação.

5- Isso tudo vale para qualquer tipo de mensagem para a qual se espera um efeito sobre a mente. Independentemente do fato de ela ser verdadeira, ou boa, ou ética, e independentemente também do meio através do qual a mensagem é transmitida.

Claude Shannon deu uma grande contribuição ao marketing. Deveria ser mais estudado. Acho uma pena que não seja sequer mencionado nesses cursos por aí…

Prevendo o futuro

A lógica da informação nos permite afirmar algumas coisas sobre o futuro. Podem cobrar. Eu garanto.

1- Nos próximos anos, a Internet será a maior força de comoditização de que se tem notícia. Os custos da economia vão tender, no geral, a cair, e os preços idem. Todo mundo vai competir só por preço. O consumidor viverá uma fase de quase euforia.

A razão disso é que a comunicação digital permite a eliminação das redundâncias que têm de estar embutidas nas ofertas econômicas tradicionais, sem perda da qualidade da mensagem. Sem perda de qualidade não: com ganho de qualidade. É uma tremenda economia. Os custos e preços da economia vão cair por isso.

Pense nos custos de uma força de vendas tradicional. Infraestrutura. Treinamento. Comissões. O intermediário típico é uma redundância na comunicação das ofertas econômicas (Bill Gates se refere ao mesmo efeito como fricção). Ele, vendedor (como o intermediário em geral), só existe na economia, porque sem ele não há outro meio de transmitir informação detalhada sobre o produto, ou mesmo de se ter acesso ao produto.

O supermercado, o shopping só existem, como entidades econômicas, porque sem eles não há meio de trazer para perto de mim coisas que são produzidas muito longe de mim. Da caixa de cereais ao computador. Do sabão de coco à calça jeans. Ou melhor, não havia. A Internet é o monumento supremo ao poder da comunicação digital. Comércio eletrônico, nesse primeiro momento é, basicamente, sobre eliminação de redundâncias na economia. Redundâncias que tinham sentido na era analógica, mas que perdem a razão de ser na economia digital. No momento em que informação precisa, abundante e barata, está ao alcance de todos, o consumidor é rei. É isso o que está acontecendo.

2- A etapa seguinte à dessa hipercomoditização será a do aparecimento do que chamo de nova diferenciação.

Você é um diferenciador quando consegue estabelecer a percepção de que vale a pena pagar mais por você, isto é: você se faz perceber como sendo diferente. Todo mundo já vai estar na Internet (ou então, vai estar morto), de modo que a dinâmica de nivelamento por baixo (comoditização) vai perder momentum, e acabará por ser substituída à medida que um novo talento emergir. Que talento será esse? Haverá quem saiba motivar o público até a pagar mais pelo que vende. Esses novos diferenciadores é que vão dar o tom. Se não é mais preço, e se todo mundo vai ter o melhor produto (tecnologia, etc…), em que é que vai se basear a nova diferenciação? Resposta: no apelo à imaginação; na competência para estimulá-la e gratificá-la. O que é que vai ser vendido, afinal, já que produto não poderá mais ser o centro de nenhuma oferta? Depois de todas as fusões e aquisições já terem sido feitas, vamos ter de aprender a competir com base em outra coisa. Essa outra coisa é “imaginação”, e os talentos para se chegar a dominá-la são os do artista, do esteta, do especialista em encenar performances. Businessmen terão de ser especialistas em ser humano. Não é poesia, é conseqüência inexorável da lógica da informação.

O que vai ser vendido são experiências. As empresas, independentemente do setor que atuem, terão de ser boas em montar experiências para engajar seus clientes. Seja qual for seu produto, ele, cliente, terá de ser envolvido em experiências estimulantes. Altamente sensoriais.

Para ser bom nisso, você vai precisar entender profundamente de realidades virtuais. Estética. Percepção. Esse é um caminho inevitável da economia, outra conseqüência da primazia da linguagem digital.

A informação, por assim dizer, procura naturalmente os caminhos que permitam a ela surpreender a mente. Havendo tecnologia abundante, ela, informação, tem sempre um repertório ilimitado de surpresas.

Graças ao digital, todo mundo vai poder participar; todo mundo vai querer viver a experiência da sua coisa, à sua maneira… A nova economia é a economia da experiência. Veremos mais sobre isso adiante.

Para ser bom nos fundamentos da nova economia da informação, você vai ter de ser bom na “mentalidade digital”. Que nada tem a ver com programação de computadores, repito. Nada tem a ver com tecnologia, repito. Tem a ver só com a produção de certos efeitos dentro da cabeça das pessoas. Marketing, como eu disse num artigo anterior para Exame, tem a ver com o que acontece na mente. Só.

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Sucesso no mundo empresarial de hoje não é definido pela tecnologia, mas sim pela imaginação.

O fantasma da informação está assombrando o mundo empresarial.
Dizem-nos que esse “monstro embaixo da cama” vai acabar nos devorando se não agirmos, mas ninguém define concretamente o que fazer, nem que habilidades adquirir para enfrentá-lo. Ficamos repetindo lugares-comuns, como “estamos na era do conhecimento” – coisa da qual ninguém discorda, mas que também não inspira nada – é vago demais, e não nos leva a agir…

Informação é um conceito de muitas faces, que intriga até mesmo cientistas e há muito tempo. Para entendê-lo, não basta defini-lo. Você tem de percorrer uma série de noções interligadas como comunicação, linguagem, realidades virtuais, códigos digitais. A mistura disso tudo é que está definindo a economia hoje. Resolvi examinar melhor essa coisa de informação, e concluí que é possível prever os contornos gerais do que vai acontecer no futuro próximo e, com isso, o que você/sua empresa devem fazer para ter sucesso nessa tal nova economia.

Veja o que concluí, e como cheguei a essas conclusões.

Confesso que nunca entendi direito isso a que chamam informação. De início, não me preocupei, parecia ser mais uma dessas noções (como estratégia, ou qualidade) cuja definição não tem consenso, mas que a gente sabe, intuitivamente, o que é. Com informação é diferente.

Cansei de ouvir: “Isso é conseqüência da economia da informação” como “explicação” para tudo que não conseguimos entender, da obsolescência de produtos como a tradicional Enciclopédia Britânica, ao sucesso do Tamagotchi; da exuberância varejista da Amazon.com, à irracionalidade selvagem das bolsas de valores. Evidentemente, essa “explicação” não nos leva muito longe. Eu sei que você, leitor, é uma pessoa informada, mas duvido que consiga me explicar operacionalmente (isto é, de forma voltada para o uso prático) o que é informação. Duvido.

Talvez, mergulhando mais fundo em busca de seu significado, possamos obter algo que nos ajude não só a descortinar melhor o futuro, mas também a agir com mais inteligência no presente. Este artigo é sobre isso.

Chega de “tendências” – vou dizer a vocês como será o futuro.

Sim, entender o significado real de informação nos habilita a falar do futuro, mas atenção: não se trata nem de “bola de cristal”, nem, muito menos, de “tendências para o novo milênio”. Li tudo o que caiu em minhas mãos sobre “tendências” e confesso: estou cheio delas. Quero é saber como fazer boas escolhas hoje. Não tenho interesse maior nas “implicações morais da clonagem”, nem nos problemas éticos de embriões humanos desenvolvidos em fêmeas de chimpanzés, muito menos nas maravilhas tecnológicas que estão chegando, como automóveis que reconhecem seus donos e conversam com eles (se eu já não gosto de conversa com motoristas de táxi tagarelas, porque haveria de querer papo com o táxi em si?).

Visões delirantes sobre o futuro existem aos montes, e me interessam pouco. Exemplo: a introdução do livro “The One to One Enterprise”, de Don Peppers e Martha Rodgers, chama-se “A Camisinha Musical”. Lá se fala dos gadgets que logo habitarão nosso dia-a-dia de forma corriqueira: o par de óculos que responde quando você pergunta: “onde, raios, deixei meus óculos?”, a chave do carro que emite um som e se identifica quando você pergunta onde ela está, e a tal camisinha que toca Beethoven quando fura em uso. Hmmm… deve ser a idade… eu posso imaginar alguma utilidade para óculos e chaves falantes, mas camisinhas tocando Beethoven? E logo quando furam? Eu hein…

Obviamente, nada tenho contra as visões do futuro que encheram as páginas de todas as publicações do mundo nos últimos meses. Todos já sabemos que o futuro pós-genoma mapeado será sensacional. Sabemos que as tecnologias de reconhecimento de voz, via chips baratos, serão uma banalidade corriqueira; que dominaremos doenças que hoje nos aterrorizam, viveremos mais, sofreremos menos… tudo isso no futuro, claro. Mas, e hoje, gente?

Hoje, ninguém nos diz nada. O presente nunca é charmoso, o futuro (sempre idealizado, sem os medos de hoje, sem as aporrinhações de sempre) é que é bacana. Pagamos qualquer coisa para que nos falem do amanhã, porque o hoje… bem, leitor, desculpe, mas o hoje é sempre uma damn shit.

Delírios futuristas são perda de tempo. São curiosos, mas apenas distraem. Esqueça a camisinha musical…
Assim que ficamos livres (graças a Deus) daquela coisa de “virada-de-século-novo-milênio-bug-2000-era-de-luz-etc” constatamos que o primeiro dia do futuro chegou e passou, exatamente como todos os outros “primeiros-de-janeiro” antes. Portanto, voltemos ao trabalho. O filme que está passando chama-se “De volta ao presente”. Sua empresa e você são parte do enredo. Divirta-se.

2. Informação – Que onda é essa, afinal?

A chamada segunda onda, que todo mundo diz que já passou, era baseada na idéia de produção em massa – seu símbolo era a chaminé. Tudo bem, pelo menos sabíamos o que estudar, sabíamos o que teríamos de saber fazer bem para ter sucesso. Hoje, na era da informação, o símbolo é… é… o quê? É o computador, dizem, mas não deveria ser, porque “computador” todo mundo domina, saber usar computador, todo mundo sabe. Então, é claro que esse tal “computador” não pode dar vantagem real a ninguém – nem a empresas, nem a pessoas. Não existe – na era da informação – nem técnicas nem mesmo saberes específicos, que, dominados, garantam vantagem de qualquer tipo. No passado havia.

Ao entender informação melhor, entendi que a grande fonte de vantagem na nova economia não é conhecimento, é imaginação. O chip é que é o símbolo da nova era, não tanto pelo que já faz, mas pelo que sinaliza como possibilidade, e o que sinaliza só é limitado pela imaginação.

Há muito mais chips-sofisticados e baratos – em objetos do que em computadores. As possibilidades de se interconectarem coisas através deles são infinitas, e essa comunicação ilimitada, sem fronteiras, está criando uma espécie de sistema nervoso distribuído pelo planeta inteiro. Está nos lançando para o ventre de uma nova realidade tecida pelos fios que fabricam esse envoltório – neurônios feitos de fibra ótica ou de sinais de rádio em dispositivos wireless.

Tudo pode se ligar a tudo via chip. Estão em toda a parte: da boneca que fala ao cocuruto do boi no pasto, que, via satélite, o reconduz para casa. Do telefone celular à caixa de cerejas, do tablete de margarina ao personal digital assistant…

O inventor da Internet (da world wide web, na verdade), o físico Tim Berners-Lee, diz que, no futuro, teremos business models muito diferentes dos que temos hoje na Internet.

“Não faremos mais coisas óbvias como fazemos hoje, [comércio eletrônico ainda] é basicamente o velho sistema de mail order colocado na rede. No futuro, a web vai ser muito mais divertida, vai se integrar melhor com a vida do dia-a-dia e será algo que nem vai exigir computadores para se ter acesso. Seus filhos vão pegar uma caixa de cereais, por exemplo, vão virá-la de um lado para outro, procurando alguma coisa. De repente, vão achar algo: “o que é isso?”. Vão puxar a tal coisa para fora e desenrolá-la. Será algo magnético, e eles irão até o refrigerador, vão introduzi-lo nele e começarão a navegar na web com ele”.

Marc Anderssen, co-fundador da Netscape – o primeiro browser comercial – pensa da mesma forma: “qualquer coisa que tenha uma lasca de silício incrustada vai acabar conectada à web. Carros, aparelhos de cozinha, eletrodomésticos… todas essas coisas terão seus próprios endereços na rede…”

Computador, tecnologia, Internet, chip, nada disso dará vantagem competitiva a ninguém. Todo mundo terá essas coisas. A fonte da vantagem vai ser tirar partido dos tipos de conexão/comunicação que o chip possibilita. Isso é que ninguém domina ainda. Comunicação é só o que há em economia. Toda a atividade econômica é sobre comunicação.

O que é mesmo informação?

Fui atrás do significado que analistas econômicos dão ao termo informação, passei pela definição técnica, pesquisei até mesmo o que cientistas (físicos, biólogos, especialistas em inteligência artificial) entendem por isso. Concluí que, para nós, interessados em performance empresarial, informação é um conceito de duas faces.

– Informação é surpresa. É algo que se descobre (no sentido de algo que você não sabia antes) e, passando a saber, altera seu comportamento ou atitude.

e

– Informação é aquilo que dá forma a alguma coisa (in-forma). É a “cola” que junta componentes separados e faz com que algo tenha uma existência digna de nota. Faz com que esse algo seja distinto. Singular.

Pode parecer banal, mas não é. Tudo o que interessa sobre informação no contexto do mundo empresarial se encaixa nisso. As duas faces são, na verdade, uma coisa só. O exemplo a seguir ajuda a entender isso.

Isso que nós chamamos, genericamente, de “ser humano” é, como todo ser vivo, o resultado do processo de captar e processar informação. Poderíamos começar com o aparecimento do DNA há vários bilhões de anos. Uma tripa de componentes químicos que, aprendendo a codificar informação em níveis cada vez mais sofisticados, acabou chegando até nós, humanos. Mas a história ficaria longa demais. Vamos saltar uns 4 ou 5 bilhões de anos. A agricultura está começando.
Quando nossos antepassados, caçadores-coletores, há uns dez mil anos, perceberam que podiam interferir na natureza, a humanidade ganhou uma nova dimensão. Em vez de sair por aí tentando caçar os animais que cruzassem seu caminho, aprenderam a domesticá-los; em vez de colher o que a natureza colocasse à sua frente, descobriram que poderiam preparar o solo, plantar e colher em épocas previsíveis… A civilização começa aí.
A mente humana percebeu que podia pegar fatos soltos e desconexos (os dados daquele ambiente em que viviam) e ordená-los segundo um novo padrão, reconfigurá-los de forma nova e criativa, de modo a gerar um novo efeito. Um efeito surpreendente.
Processar informação é isso aí.
Os dados soltos, isoladamente sem maior significado, eram: sol, chuva, sementes e mudas de vegetais, calor, frio, solo, bichos andando por aí, animais alimentando-se, gerando crias… A ordenação nova começou a surgir quando alguém foi capaz de pensar algo como: “Se eu preparar o solo na época certa e jogar sementes nele, se chover o suficiente e fizer sol na medida certa, daqui a algum tempo vão nascer plantas com as quais eu poderei me alimentar. Se eu capturar alguns animais (em vez de matá-los para comer) e confiná-los num certo espaço, alimentando-os eu mesmo, depois de um certo tempo nascerão crias, e eu terei alimento sem depender dos caprichos e incertezas da caça. Além do mais, poderei usar o estrume desses animais para tornar o solo mais fértil e usar sobras dos alimentos que minha colheita gera para alimentar a eles próprios…”
É isso o que significa transformar dados em informação.

Informação altera o quadro vigente. Muda as coisas. Gera um efeito que interessa à mente humana por alguma razão, que foi plantada no cérebro pelos mecanismos que o construíram ao longo da imensidão do tempo. O ser humano é causa e efeito do processamento da informação. A vida, biologicamente, é puramente um processo de codificação e transmissão de informação.

A capacidade de filtrar e organizar dados soltos, comprimi-los em arranjos que façam sentido (do pedregulho para uma machadinha de pedra lascada, de um som solto para uma palavra, uma sentença e daí para uma história…), é a essência da coisa. “Transformar tédio em melodia”, como diria o Cazuza.
Em níveis sucessivamente mais elaborados, é isso o que humanos são desde sempre. É isso que nos torna humanos.
Com a agricultura começa a civilização, mas ela só acelerou o processo. Nossas ferramentas, nossos artefatos, nossa linguagem, nossa tecnologia – tudo ricocheteia de volta sobre nós mesmos, altera nossas cabeças mudando continuamente tanto o que somos como a forma como entendemos a nós próprios.

Economia é sobre comunicação. A economia da informação tem a ver com comunicação muito mais ampla (abrangente), fácil, precisa e barata para todos os envolvidos em transações econômicas – clientes e empresas.

Claude Shannon e a teoria da Informação

Tecnicamente, a definição de informação foi introduzida pelo engenheiro americano Claude Shannon em 1948. Shannon – da Bell Telephone Company – estava interessado nos aspectos econômicos do envio de mensagens através de linhas telefônicas; isto é, ele tratou informação como uma mercadoria, mas o que descobriu vale para qualquer tipo de mensagem, transmitida através de qualquer canal, não só através de fios telefônicos.

Ele percebeu que muito do que se transmite em qualquer mensagem não é informação, é o que ele chamou de redundância, notando que poderíamos economizar (dinheiro mesmo) se pudéssemos codificar a mensagem de forma a eliminar redundâncias.

Redundância é a parte da mensagem que não informa, ou porque quem recebe a mensagem já sabe daquilo, ou porque duplica algo que já está na própria mensagem. Por exemplo: “Rex é um cachorro pequinês”. A palavra “cachorro” é redundante, porque pequinês já informa que Rex é um cachorro.

Quando a preocupação central é economizar, você trata de eliminar o máximo de redundância, e se concentra na parte realmente informativa da mensagem. Por exemplo, quando coloca um anúncio classificado ou quando mandava um telegrama (naquela época pré e-mail, lembra?):
“Chgo qta 10h, GUA, NY, encontr lj VRG 2 and”.
A mensagem acima transporta a mesma quantidade de informação que a frase mais completa e redundante:
“Chego na quarta feira às 10 horas em Guarulhos, vindo de Nova York, encontre-me na loja da Varig no segundo andar”.

Mensagens menos redundantes são realmente mais baratas para se enviar, mas dão muito mais trabalho para decifrar. Quem recebe pode se cansar e desistir. Mensagens sem redundância são chatas, são secas como anúncios classificados.

Sem alguma redundância, você não comunica nada em marketing, mas saber quanto de redundância e quanto de informação reter na mensagem é um desafio e tanto. Voltarei a essa idéia.

Shannon mostrou que qualquer mensagem (repito, qualquer mensagem) pode ser decomposta em três componentes:

informação – aquilo pelo qual realmente valeria a pena pagar em condições ideais.

redundância – aquilo que poderia ser retirado da mensagem por motivos econômicos, pois quem recebe já sabe, ou pode deduzir (apesar de nem sempre ser possível fazê-lo por razões práticas – ninguém leria um livro escrito na linguagem dos anúncios classificados).

ruído – que é simplesmente lixo, sem significado.

Se você está interessado em marketing (e você tem que estar interessado em marketing), sua competência será definida pelo grau com que você faz o balanço entre a informação transportada por sua mensagem, a redundância mínima que você tem de manter para garantir a integridade dela, e o lixo que você tem que eliminar o máximo que puder.

Informação está sempre associada à surpresa; isto é, a algo não esperado, não sabido, algo que foge à mesmice.

“Fez calor no Rio durante todo o mês de janeiro” contém muito pouca informação, porque quem recebe a mensagem não fica surpreso com ela (ela não desperta sua atenção), mas: “nevou no Rio durante o mês de janeiro”, certamente provocará manchetes em todo o mundo, pois tem muito mais informação.

As gotas de chuva que caem ao seu redor não chamam sua atenção, mas a gota que atinge seu nariz, ou a lente de seus óculos, faz você reagir e, portanto, contém mais informação.

Acha abstrato? Ok, é abstrato, mas é… bem, é um abstrato muito concreto, entende? Não entende? Eu explico: a noção mais central em marketing é a noção de valor. Como se define valor? Valor é uma noção abstrata que relaciona o preço que eu pago com o benefício que eu recebo:

– Um Big Mac por 1$? É um bom valor, eu pago.
– O quê?! Um Big Mac por 10$? Tá caro, eu não pago.

Portanto, abstrato ou não, qualquer dono de botequim entende perfeitamente a noção de valor. Valor é o que faz o cliente botar a mão no bolso ou não. Não é simples?

Todo dia, dirigindo para o trabalho, eu ouço o repórter aéreo informar: “São sete da manhã e começa a aumentar o fluxo de veículos nas ruas”. Qual o conteúdo de informação nessa mensagem? Zero. O fluxo de veículos aumenta nas primeiras horas da manhã exatamente todo dia. É o esperado. Essa “informação” não me surpreende. Mas, se eu ouvisse: “São sete da manhã e não há indícios de carros nas ruas”, seria uma tremenda surpresa, e eu imaginaria que algo muito sério teria acontecido.

Informação é aquilo que chama a atenção da mente humana, levando-a a agir. É uma diferença que faz diferença. No mundo empresarial, a noção de informação está intimamente ligada à de estratégia. Uma estratégia é o conjunto de coisas que você faz (atividades que desempenha), e que faz o cliente escolher você, não seu concorrente.

A força do digital

Shannon também mostrou (muito antes da era do computador) que o código mais econômico para se transmitirem mensagens é o código digital.

A unidade de medida de informação que ele inventou foi o bit (binary digit).
Apenas como curiosidade: um bit é a quantidade de informação necessária para reduzir a ignorância de quem recebe a mensagem à metade.
Um exemplo bem simples que, como outros que se seguirão, tomo emprestado de Richard Dawkins, meu biólogo favorito: um pai assiste, através da janela, à operação cesariana de sua esposa, ansioso por saber o sexo do bebê. Como, de fora, não consegue ver detalhes, combinou com a enfermeira que ela lhe mostraria um cartão rosa, se fosse menina, ou azul, se menino.

Qual a quantidade de informação transmitida quando a enfermeira exibe o cartão rosa para o pai deliciado? Resposta: exatamente um bit. A ignorância anterior foi reduzida à metade: de duas possibilidades, para uma. Outra alternativa seria o médico ir ao encontro do pai ansioso, apertar sua mão e dizer: “Parabéns, velho de guerra, fico muito feliz em informar-lhe que você é o pai de uma linda menina”. A informação transmitida por essa mensagem de 19 palavras seria ainda exatamente um bit.

Qual a forma mais econômica de transmitir a informação relevante para o pai ansioso? Claro que é através do código digital rosa-azul.

Outro exemplo: você quer montar um sistema para avisar que a esquadra inimiga está se aproximando da costa do seu país. Há cadeias de montanhas ao longo de toda a extensão do litoral, e você coloca voluntários no topo de cada uma delas, separados, digamos, a cada dois quilômetros. O primeiro que avista um navio acende uma fogueira, cuja luminosidade, ao ser vista pelo observador vizinho, faz com que ele acenda a sua, e assim sucessivamente. Logo uma onda de pontos luminosos, ao longo do litoral, irá espalhar a notícia da invasão, a grande velocidade.

Como poderíamos adaptar esse sistema para transportar mais informação? Quero avisar não só que “a esquadra inimiga está chegando”, mas também quero informar o tamanho da frota. Uma possibilidade seria: faça o tamanho de sua fogueira ser proporcional ao tamanho da frota. Frota grande, fogueira grande e vice-versa. Trata-se de um sistema analógico. Todo sistema de comunicação assim, baseado em correspondência direta entre coisas físicas, é chamado de analógico.

É claro que, com esse sistema, as imprecisões iriam se acumulando à medida que o sinal luminoso fosse percorrendo a costa e, ao chegar ao outro extremo, a informação sobre o tamanho da esquadra inimiga teria sido reduzida a nada. O conteúdo da mensagem teria se degradado. Exatamente como quando você tira xerox-do-xerox-do-xerox-do-xerox…, pequenas imprecisões vão se amplificando a cada cópia e, no final, se o número de cópias é grande, você tem um borrão. Informação zero.

Todo código de comunicação analógico tem esse problema. Analógico é o oposto de digital.

Como um código digital resolveria isso? Uma possibilidade é a seguinte: não se preocupe com o tamanho das fogueiras, elas podem ter qualquer tamanho. Dando para acender um foguinho cuja luz seja visível pelo ocupante do próximo morro, tudo bem.

Coloque um anteparo ao redor de sua fogueira. Para mandar um flash de luz para seu colega no topo do morro vizinho, basta levantar e baixar o anteparo. Repita esse flash um certo número de vezes e depois deixe o anteparo encobrindo a fogueira. Fica tudo escuro durante certo tempo. Repita tudo. O número de flashes em cada seqüência é proporcional ao número de navios na frota. Se o observador vizinho conta oito flashes, é oito flashes que ele passa adiante para o próximo observador. A mensagem tem uma ótima chance de percorrer todo o litoral, de norte a sul, sem se deteriorar.

Esse é outro exemplo da superioridade do código digital.

Como regra geral pode guardar o seguinte: o código digital é o que garante mais precisão e economia na transmissão de qualquer mensagem. É o que permite que se elimine mais redundância que qualquer outro, sem perda de qualidade, ou melhor, garantindo mais ainda a integridade da mensagem; é também o que permite o máximo de eliminação de lixo (ruído).

É recente a descoberta de que nossos cérebros processam informação muito digitalmente, no sentido dos flashes acima. Células nervosas também emitem pulsos (disparam), num processo comparável ao dos flashes, mas o que viaja nelas são picos de voltagem ra-ta-ta, como numa metralhadora. É o arranjo, o padrão dos picos de voltagem, que transmite informação ao cérebro, como a seqüência de flashes da fogueira. Se você sente quente ou frio, se vê azul ou amarelo, se distingue o rosto de sua avó ou não, isso é traduzido para o cérebro de uma maneira quase digital, por diferentes seqüências de ra-ta-tas. Se pudéssemos ouvir dentro do cérebro, ouviríamos essa bateria se alternando entre diferentes ritmos, não diferentes alturas. Se, para nos avisar, por exemplo, que a água está pelando, o cérebro usasse as alturas dos picos de voltagem, não seu ritmo, isso seria um código analógico (temperatura alta – voltagem alta) não teria precisão, e a mensagem seria distorcida. Você ia acabar se queimando.

Genes transportam informação digitalmente. Exatamente como num computador ou num CD-ROM. O DNA não usa o código binário, mas um código quaternário. Essa é a única diferença: enquanto num computador é 1 ou zero, no DNA pode ser A , T, C ou G. Genes são digitais no exato sentido do computador. Não é de estranhar. Os organismos vivos, estão vivos porque souberam reter a informação necessária para produzir crias saudáveis e passar a mensagem adiante. Qual a melhor maneira de garantir a integridade de qualquer mensagem? Você já sabe: é através do código digital. Foi esse código, então, que a natureza acabou escolhendo. A revolução digital em biologia começou em 1953. Você, hoje, pode ler um gene. Pode escrevê-lo precisamente num pedaço de papel, colocá-lo numa biblioteca e, mais tarde, em qualquer momento no futuro, reconstituí-lo exatamente e colocá-lo de novo num animal ou planta. Quando o projeto genoma humano estiver completo, por volta de 2003, será possível escrever todo ele em alguns CDs, e ainda vai sobrar espaço para incluir um livro-texto grande com explicações. Mande os CDs para o espaço distante num foguete e a espécie humana pode até vir a ser extinta na Terra, que haverá uma chance de uma civilização qualquer recuperar os CDs e reconstituir um ser humano completo – uma especulação pelo menos tão plausível quanto à do filme Jurassic Park. Ambas baseiam-se na precisão do código digital. O DNA é exatamente isso: longos fios de pura informação digital.

Não é tecnologia, estúpido, é imaginação!

Bruce Merrifield, ex-secretário de comércio dos EUA, mostrou em 1988 que 90% da informação codificada que se tem no mundo havia sido produzida depois de 1960. Ele previu, na época, que a quantidade de informação então disponível dobraria em 15 anos e, como resultado, haveria mais mudança nos 25 anos que se seguiriam, do que a humanidade experimentara durante toda a sua história. Mudança em sentido amplo – mudança de atitude diante de valores e práticas estabelecidas. Informação, no sentido que nos interessa, é isso aí.

A curva de Merrifield começa sua subida quase vertical no início da década de 60, quando os primeiros computadores ficaram disponíveis para uso comercial. Por isso, muita gente pensa que foi a tecnologia – o computador – que causou a era da informação. Erro grave. Tecnologia é, no máximo, a metade da história.

A essência do sucesso na era da informação é ser singular. Tecnologia não gera singularidade. Tecnologia apenas permitiu a explosão, não a causou.

Qual foi a causa então? Foi a imaginação humana que se liberou.

Foi o aumento extraordinário de nossa capacidade de criar – graças ao código digital -representações simbólicas de objetos e ações reais, riquíssimas em significado humano (informação é isso, certo?) e, portanto, repletas de possibilidades de mudanças de atitude.

A mudança que está ocorrendo no mundo não é fruto da tecnologia, é fruto da linguagem digital que, ao permitir que tudo se comunique com tudo, cria um mundo novo.

3. Tamagotchi, videogames

Realidades virtuais, tão reais quanto a mais real realidade. Essa capacidade de as representações simbólicas interferirem drasticamente no mundo real, para o bem e para o mal, é ainda pouco entendida, mas seus efeitos estão aí. O projeto, construção (virtual) e teste de um artefato complexo como o Boeing 777, ocorreu totalmente no cyberspaço. O protótipo do 777 foi uma abstração eletrônica, o primeiro 777 realmente construído foi direto para a operação comercial.

Abstrações simbólicas que podem ser manipuladas digitalmente podem ser criadas, modificadas e movimentadas muito mais rapidamente do que seus equivalentes físicos. Daí a explosão. Informação e conhecimento codificados digitalmente estão substituindo capital, terra e energia como força motriz da transformação.

O lado escuro dessa coisa virtual-real é que parece haver, em casos específicos, alguma relação entre comportamentos neuróticos e autodestrutivos com esse mergulho no virtual que a linguagem digital possibilita. Desconfia-se de que haja uma relação entre inexplicáveis episódios recentes de assassinatos em massa e alterações psicológicas induzidas pelas mensagens hiper-reais de certo tipo de videogame, que parecem sair da tela, invadir a mente e induzir alterações radicais de comportamento.

No dia 13 de maio de 1997, a agência de notícias Reuters divulgou o seguinte:
“A polícia interrogou na segunda-feira os pais de uma menina de 11 anos encontrada morta em seu quarto dia 10 passado. Aparentemente foi suicídio, e a suspeita é que o motivo tenha sido o desespero causado pela morte do seu Tamagotchi, um animalzinho de estimação virtual que funciona num dispositivo em forma oval, cuja tela exibe um ícone semelhante a um bichinho. A menina deixou um bilhete, e um frasco vazio de pílulas foi encontrado a seu lado. Seus pais estão desesperados: “Pensávamos que era apenas um brinquedo inofensivo”, disse a mãe. A Bandai America, empresa que importa o Tamagotchi, não quis declarar nada.

Esse é um caso extremo, mas há outras histórias de ruptura emocional causada pela morte do brinquedo virtual. Como se pode ir tão longe por causa de um brinquedo? O poder da linguagem digital para alargar as fronteiras daquilo que chamamos de real é intrigante…

A informação nos empurra para vivências, para experiências. A linguagem do chip nos possibilita mergulhar noutro tipo de mundo. Queremos experimentar, queremos fazer, e o marketing do futuro próximo será baseado nesse fato, conseqüência da nova lógica da economia, possibilitada pela linguagem digital.

Um artigo na edição especial da “Economist”, no final de 1999 (The Road to Riches, 31 de dezembro de 1999), examina o aumento da riqueza do europeu ocidental nos últimos 1000 anos.

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