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O número que mede valor em saúde

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Quando surgiu, um DVD player custava mais de 1000 dólares; hoje você encontra um (muito melhor) por uns 20 dólares. Chamam isso de “efeito Wal Mart“: grandes empresas usam seu poder de barganha para induzir seus fornecedores a entregarem mais por menos, e repassam parte da economia para o consumidor. Num mercado em que exista competição real, os custos caem e os preços acabam acompanhando.

Não existe efeito Wal Mart em saúde porque o mercado de saúde é “torto”, não funciona direito. O que faz o preço do DVD player cair é um consumidor que paga por ele do seu próprio bolso. Por isso, ele se informa, compara e busca alternativas. A competição para conquistar esse comprador derruba o preço. Isso está na origem da engenharia do valor a que me referi no post anterior.

Em saúde, o usuário (nós) e seus representantes (as empresas que contratam planos de saúde) não têm a menor ideia do valor que é gerado para o usuário. Ninguém tem. Falei em mercado torto? Bota torto nisso!

Mas existe uma fórmula que resolve isso. Valor é igual ao “desfecho” de alguma coisa realizada para um cliente, dividido pelo custo para se chegar a esse desfecho.

“Valor= desfecho/custo” é a fórmula que muda o mundo em saúde. Não há ferramenta mais fundamental . Ela é uma lei da natureza, o nosso equivalente ao E=MC2 de Einstein.

(às vezes usam os termos “métrica”, “atributo”, “medida”, e “outcome” para desfecho).

A definição rigorosa de desfecho é a seguinte: “desfecho é a medida do benefício que o cliente recebe”. Benefício? Sim. Benefício é o que o cliente diz que é. Ponto. Acabou. Não há mais nada além disso.

Mas, não se iluda, isso é muito e pode abrir as portas de um universo como o E=MC2 de Einstein abriu. Tudo o que se compra- tudo o que alguém paga para conseguir- tem seu preço definido por essa fórmula (se o mercado é decente). Fazemos a conta intuitivamente, mas fazemos a toda hora e em toda parte- na compra de um par de sapatos ou de um apartamento; na feira ou no restaurante; comprando um produto ou um serviço, chamando o Uber ou pegando um táxi comum.

Quer comprar um carro com banco de couro? O custo do fabricante será maior e, portanto, o preço que você vai pagar também: idem para direção elétrica, wifi , câmbio automático, GPS de fábrica e outras coisas. O que chamamos genericamente de “qualidade” de um produto ou serviço, está associada a uma coleção de desfechos que tem um custo (tudo que tem valor tem custo!). Alguns desfechos são tangíveis outros intangíveis.Valerá a pena pagar por eles? Se você achar que vale, vale.

A pergunta- “vale à pena?”- é você quem responde de acordo com seus critérios!

Uma marca é um atalho que remete a uma coleção de desfechos. Quando você diz: “comprei um Mercedes” não precisa dizer mais nada; quem ouve já tem uma boa ideia da coleção de desfechos pelos quais você pagou. Pagou caro, em comparação com outros tipos de carro, mas comprador de Mercedes não liga para isso, só liga para valor.

Quando comparamos conjuntos de desfechos como “consumo de combustível”, “aceleração”, “valor de revenda após dois anos”, “custo de manutenção”, “tipos de acessórios” etc..Terá maior valor o que custar menos (mas você tem de medir e comparar os mesmos conjuntos de desfechos – “laranja com laranja” -não vá comparar um BMW com um carro 1000!) .

Todos já perceberam que este é o caminho para a saúde- o valor gerado para o paciente (como expliquei no post anterior). Para isso teremos de saber quais as coleções de desfechos que o paciente quer para sua condição de saúde- doença a doença- e comparar os custos para obtê-los.

O prestador que tiver o menor custo para o conjunto de desfechos definido para certa condição de saúde, terá o maior valor.

O que falta para que cheguemos a isso em saúde? Faltam duas coisas:

a-    Falta um padrão aceito por todos, que defina quais são os desfechos para cada condição de saúde . Esses desfechos têm que ser definidos pelo paciente (não pela academia, não pelas associações médicas, não por especialistas, não por pesquisadores …- pelo cliente!!). É inacreditável que esse tipo de padrão não exista em medicina. Existe em todo tipo de indústria, mas acham que saúde é diferente. Estão errados.

b-    Falta um pagador poderoso (um equivalente ao Wal Mart)- uma grande operadora de saúde, ou uma empresa com muitos funcionários, que chegue para seus prestadores e diga:

– “Olha dr. X, o senhor opera coluna, e eu sei qual é seu custo por cirurgia porque sou eu que pago! Segundo o padrão, os desfechos definidos para essa condição de saúde (cirurgia de coluna – dor lombar) são coisas mundanas como:

Tempo que o paciente demora para voltar a trabalhar/Intensidade da dor que sente nas primeiras semanas/qualidade do seu sono/ tempo em que volta a caminhar/ o grau em que recuperou a funcionalidade sexual..

( Coisas assim. Só aquelas coisas que interessam a clientes reais, na vida real!).

-Bem, doutor. Nós dividimos os desfechos que seus clientes obtém após a cirurgia (medidos por aferidores independentes, segundo o padrão aceito internacionalmente) pelos custos que o senhor nos gera e…

 -….chegamos ao número que mede seu valor, doutor! No seu caso foi 6, mas outros prestadores em nossa rede, para a mesma condição de saúde, tiveram valores 8 e 9 (numa escala de 1 a 10). Eles geraram mais valor para seus pacientes do que o senhor e, portanto, doutor, eu vou pagar mais a eles.

Estamos buscando novos cirurgiões de coluna que farão contratos conosco baseados em valor (desfecho dividido pelo custo). A partir de agora só vamos remunerar por valor.

Ah, doutor, eu ia esquecendo- estamos divulgando na web os índices de valor de todos os nossos prestadores para todas as condições de saúde. Nossos clientes pessoa física e empresas pagadoras poderão saber o valor que cada um gera. Quer ganhar mais? Gere mais valor. Passe seu índice de valor de 6 para 8 para ficar na média dos melhores. Boa sorte!”.

Para que isso seja possível é necessário apenas UM número- o índice de valor do prestador (desfecho/custo) para a condição de saúde considerada, aferido segundo critérios aceitos por todos. Precisaremos medir desfechos de acordo com algum padrão, pois os custos já sabemos (quem paga sabe).

Tudo indica que há um padrão emergindo para desfechos em saúde. Devemos colocar toda a nossa esperança e foco nisso, pois é a saída mais próxima que temos para resolver o tenebroso quebra cabeças da saúde.

Veja próximo post.

 

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