Innovatrix

O conselho de Einstein

Discordo de Gary Hamel. Em seu último livro – “O Futuro da Gestão” – ele diz: “o Google é um pioneiro da gestão moderna que tem muito a ensinar sobre como construir empresas realmente adequadas ao século XXI”. É bom ter cuidado com Hamel. Eis o que ele escreveu sobre a Enron pouco antes do desastre: “Mais do que qualquer empresa do mundo, a Enron institucionalizou a capacidade de perpetuar a inovação, é uma empresa onde milhares de pessoas se vêem como revolucionários potenciais”. Como diria o Hugo Chavez, “revolucionários de mie..da” é o que eles eram. Por que o Google seria o “paradigma da gestão do futuro” e não British Petroleum, Toyota, ou Wal Mart, por exemplo? Empresas de Internet são mais sexy, né? Tá certo: o Google é bacana, atrai talentos em penca, é engraçada, criativa, informal. Sua sede tem barbeiro, piscina, quadras de vôlei, creche. A turma trabalha com grande liberdade. Mas foi isso que causou seu sucesso? Não. A causa foi uma só: um inteligentíssimo processo de fazer dinheiro com propaganda, descoberto meio por acaso, e introduzido antes (não depois!) da gestão libertária que agrada tanto a Gary Hamel. A Microsoft partiu para o tudo ou nada, querendo o Yahoo de qualquer maneira, porque vê que o Google ficou imbatível. Sua força é análoga à que a própria Microsoft criou no passado para si: uma vantagem inicial que se auto-reforça e blinda a empresa da competição. A diferença é que o produto do Google (seu sistema de busca) se revelou muito melhor do que o de seus concorrentes; o Windows nunca foi melhor do que o sistema Apple, apenas se propagou mais rápido, tornando a Microsoft monopolista. Antes do Google, você digitava uma “palavra-chave” e os buscadores existentes (Alta Vista, Hot Bot, lembra?) listavam as páginas em que ela aparecia mais. O Google mudou isso: as páginas listadas são aquelas mais acessadas a partir de links clicados por pessoas que já procuraram aquilo que você está procurando. Qualidade e rapidez dos resultados melhoraram muito, e o Google virou a search engine mais usada na rede. Empresas correram para colocar lá anúncios relacionados às palavras-chave que lhes interessavam, e o Google (dando uma de gostoso) estimulava-as a fazerem leilão (quem dá mais?) pelo privilegio de anunciarem ali. Muito segura de si, só cobrava quando alguém clicava no link do patrocinador. Tudo se reforça. Se clicam mais na minha página, ela aparecerá primeiro quando alguém buscar pelas palavras-chave que me caracterizam; meu link de propaganda no Google será o mais clicado também, o que aumentará os cliques na minha página etc. Todo click num link qualquer na Internet, reforça o modelo do Google ganhar dinheiro. Uma “mina de ouro”, baseada num fato banal: se duas coisas são consumidas juntas, quando aumenta o consumo de uma, o da outra aumenta também (cachorro quente e catchup; lápis e apontador; DVD players e DVDs). O Google “força” tudo o que é clicado na Internet a virar complemento ao seu negócio. Como diz Nicholas Carr (link em meu blog): “quanto mais coisas se faz na Internet, mais anúncios as pessoas vêem, mais dinheiro o Google ganha e mais dados coleta sobre comportamentos e necessidades das pessoas [reforçando sua força]”. O Google dá de graça o cachorro quente – a informação que você busca; e cobra pelo catchup – a propaganda sobre o tema que você está buscando. É por isso que eles não param de dar coisas de graça: Gmail, Google Maps, Vídeos, Bloggers. A Microsoft se apavora com a possibilidade deles darem aplicativos grátis também (processadores de texto, planilhas…), pois isso ameaçaria o dinheirão que ela ganha com o Office. Tudo muito bom, tudo muito bem, mas – sem querer ser chato – não tem nada a ver com “gestão do futuro” não, viu Mr.Hamel?

* Artigo publicado na Revista Época Negócios – Nº 13 – Março 2008 – Coluna INOVAÇÃO.
Visite meu blog e coloque lá seus comentários sobre esta matéria.

Leia também